Na selva do Congo
Capítulo 11
“Quadros da vida de um Homem só.”
Uma cama feita, uma rede mosquiteiro, uma cadeira de plástico, uma janela virada para o portão da casa, um homem, um homem sentado na cadeira de plástico, um pc ligado, uma folha do word, está folha, está mesma folha, é mais uma tentativa de se olhar, olha e escreve, mas não se vêm, eles, quem são eles? São a mesma pessoa? Talvez...
O único olhar que o espreita, é o olhar do espelho, não restam mais olhares, daqueles olhares em que tal como o espelho aqui pendurado nos olha, nos são familiares, que parecem conhecer-nos...
Regressa ao lugar que nunca deixou, coça a perna, liberta gases intestinais, dá um jeito ás costas e de novo parte ao seu encontro, como um cão parte ao encontro da sua cauda.Nada encontra, pois encontra-se só, não há espelhos para além do pequeno espelho pendurado na parede, não há imagens que o olham e que lhe transmitam identidade; numa palavra, não existe.
“Quadros da vida de um Homem só.” (Novo tema fotográfiaco)
Onde começa e acaba a nossa intimidade? Os espaços como palco da vida - servirão eles para desmistificar os indivíduos ou pêlo contrário – servirão eles para mistifica-los? Seremos nós os actores principais da cena ou será ela - a ideia que construímos baseados na ideia que os outros personagens - próximos ou distantes – fazem de nós (também eles actores principais da cena dentro de um cenário construído da mesmíssima forma - com ideias emprestadas...)? Até onde se estende a realidade e a ficção e como enquadrar-las de forma a que ambas componham a paisagem em medidas iguais, equilibradas?
Poderão as imagens reflectir estados de equilíbrio entre o que existe e o que deixou de existir? Entre o passado momento e o momento em que admiramos o passado? Serão tentativas vãs de imortalidade – pois só voltarão “à vida” dentro do quadro da ficção, do sonho, da projecção do sentimento, aquando de outro ser se encontrar receptivo, isto é partilhar a mesma essência emanante dos sentidos. E como serão os cenários nessa altura, quais as ideias dominantes do Sistema do momento?
Eu sou agora o “incógnito” aquele que é na medida do que foi; uma conta de aritmética - de somar e subtrair, - uma “estranha forma de Ser”. Aqui me exponho - unicamente aos vossos olhos. Sou de certa maneira um estranho para muitos, mesmo os que ainda guardam na memória outros quadros da vida do meu passado mais longínquo... ; estranho no sentido de não poderem construir uma imagem, uma identidade composta dos vários estágios da minha vida (da vida de cada um) pois é esse conjunto que permite estabelecer um tempo dentro de um espaço, tal como uma árvore é o registo das sucessivas estações do ano, do tempo, se assim queiramos. Assim sendo, serão essas pessoas – as que possuem uma colecção mais vasta de “quadros da minha vida" as que mais se aproximam da essência do meu ser ou de qualquer outro ser que esteja em causa. Todas as outras formas de sentir as imagens são incompletas, redutoras, mesmo mutiladas.
Este novo tema fotográfico é um claro sinal de alerta de um espírito preocupado com a solidão, a ausência, a falha do diálogo, o fim da razão... O autor (eu) é submetido à categoria de alvo fotográfico e estando consciente disso, transforma a imagem num cenário de teatro. Ele passa a ser não só o observador como o observado. Não improvisa, pensa; actua de acordo com o cenário que acha atractivo, convincente - influencia e deixa-se influenciar pélo cenário.