Quando o tecido social se estende para além da flexibilidade que o sistema pré determinou, propicia a sublimação das vontades ocultas/oprimidas dos indivíduos que o compõem. Surge então um novo padrão à superfície dessa inalterada textura. O momento é propício para a contemplação interior, do eu, desse eu que tece o tecido engrossado por camadas geracionais onde umas sobrepõem as outras com determinada ordem e em determinado tempo – fósseis do passado de onde emergem as velhas questões, encapotadas com novos dilemas agitando os corações desgovernados à espera que lhes devolvam as fatiotas, os pensamentos, e as respostas prêt-à-porter.
“As vossas batalhas inspiram-me – não as evidentes batalhas materiais mas aquelas que foram combatidas e vencidas atras da nossa testa” - James Joyce
Que estímulos nos farão abandonar o convencional / o sistema / a hierarquia? Não será a imaginação arma suficientemente poderosa para romper com a cegueira dos tempos?
“Se desejamos que a nossa civilização sobreviva deveremos quebrar com o hábito de deferência com os grandes homens.” Karl Popper
Olho para o espelho e revejo-me no passado, talvez seja por isso!; a distância que nos separa afinal não existe – é só a forma que nos distancia; não, não é a memória que vos falha, que me falha; aquilo que eu não vejo e/ou que fui “esquecendo” não é devido à distância/espaço que se interpôs entre a infância/passado e o presente, mas sim pela sua ausência, a ausência da distância. Aquilo que não vemos resulta não só da curvatura da terra/distância, mas também da sua proximidade à pele.
“Nós somos o que pensamos havendo-nos tornado naquilo que havíamos pensado.”
Siddhartha Gautama
È claro que posso/podemos traçar o caminho sozinhos e não o conceberia de outra forma, pois a morte sendo parte do
caminho, foi, é, e será sempre solitária; o que não impede que a vida se cruze com os demais caminhantes do mundo, sejam eles animados ou inanimados e possam caminhar lado a lado. Assim o demonstra a Natureza (onde no presente a
humanidade na sua esmagadora maioria se autoexclui) nas suas mais diversas manifestações.
"Não somos como aqueles que chegam a formar pensamentos senão no meio dos livros - o nosso hábito é pensar ao ar livre, andando, saltando, escalando, dançando …" Friedrich Nietzsche
O conhecimento e a sua dúvida são operados de forma a obter a obediência de uma maioria que os acolhe (Conhecimento & Dúvida) em segunda mão, manipulados, descontextualizados, etc… Parece-me que todo o conhecimento adquirido deveria ter como função questionar o próprio conhecimento e não estar ao serviço do modelo que o proporciona, manipulando-o de acordo com os seus interesses, estejam eles nas mãos de uma minoria ou de uma maioria. Mas como poderemos progredir no caminho, quando renegamos a nossa natureza e os elos a que ela se encontra interligada? Determiná-los não foi necessariamente iluminar o nosso obscuro caminho na vida, e a corrida que permanentemente se instalou nas nossas vidas não nos deixará apanhar o momento que a poderá transformar e criar uma nova ordem na sociedade onde a imaginação nos possa levar pelo outro caminho, que embora desconhecido e que à primeira vista nos possa parecer perigoso pela simples razão de abominarmos a morte / o desconhecido seja a alternativa ao colapso que de perto já se avista.
Quem ainda não se apercebeu do colapso? Convido-o/a a olhar-se ao espelho. O que vê? Interrogações. Suas? Incutidas pelos outros? Não importa, as interrogações tal como culturalmente as assimilámos são o espelho de uma sociedade que instalou a dúvida no seu seio e que altera a sua forma de acordo com o lugar e a necessidade de poder operar para se auto beneficiar. O Medo talvez seja a sua forma mais poderosa de agir e dominar. Uma sociedade cujos seus indivíduos estão/vivem subjugados pela dúvida/medo, é uma sociedade enferma e continuamente à espera que essa mesma sociedade lhe venha prescrever a cura – Terrenos pantanosos, labirínticos, onde a imagem (a tua), o reflexo (dos outros em ti), a dúvida (estarás a agir de acordo com o modelo?) e o medo (sairás a perder por não obedeceres ao modelo) confundem-se, imiscuem-se, anulam-se, e esvaziam-nos de conteúdo, deixando-nos sós entre os nossos (onde as afinidades mais se aproximam) e inimaginavelmente inescrupulosos em relação aos outros seres humanos (onde as afinidades menos se aproximam), e em relação ao planeta que partilhamos com todos os outros seres animados e inanimados que o compõem. Nós, seres humanos, tornamo-nos na excepção da regra, já que não existe espécie animal e/ou vegetal no planeta que reja a sua sobrevivência/existência impelida pelo medo, pela dúvida e excepcionalmente abraçamos a vida convencidos que iremos vencer a nossa própria razão de ser/existir.
"Os Aborígenes aprenderam com as suas histórias que uma sociedade não deve estar centrada no homem, mas sim centrada na Terra, caso contrário eles esqueceriam a sua origem e finalidade... Os seres humanos são propensos a comportamentos de exploração se não são constantemente lembrados que estão interligadas com o resto da criação, que como indivíduos são apenas temporais no tempo, e as gerações do passado e do futuro devem ser incluídas na sua percepção do propósito da sua vida."
Morris, C