A cor do silêncio é negra.
O som do fim ensurdece-me.
Não encontro a verdade,
Nem as palavras se mostram.
Esmaga-me o peso das memórias,
A reconstrução sobre as ruinas,
A civilização…
Náuseas sobre uma terra à deriva.
Um coração desterrado;
A mesquinhez humana.
Formigas comem outras formigas,
Arrotam sapos,
Trilos sem fim exalados de diminutos pulmões.
Unhas cuspidas para o chão;
Repetições de um ser abandonado.
Moscas à espera dos meus excrementos,
Cortes nupciais de zun zums alados,
Pássaros de bicos abertos.
Desejos voluptuosos,
Lábios perdidos no escuro,
Sonhos entrelaçados.
Há uma recta e um momento,
Uma curva e uma canção.
Amanhã, amanhã, só vou saber amanhã!
Abraçamo-nos e quando nos abraçamos, abraçamos a mesma dor -
A dor de ser, a dor de sentir o ser.
Traição! Traímos o nosso coração!
Provamos do veneno que inquinará o mundo!
Que o tornará inabitável.
Queria-te perdoar,
Mas não fui capaz, pensei que me perdoarias tu…
Tanto tempo!; reduzido a pó, a uma arrogante espécie de argamassa convencida de aguentar uma amizade alicerçada sobre as cinzas de um amor queimado.
Fumo negro de almas translucidas atiradas ao inferno - Holocausto
Fumo negro de almas translucidas atiradas para o progresso – Génocidio
Variável, veloz e doce canção com motivos assobiados em tons altos – Stiphrornis erythrothorax.
Invariável, fulminante e amarga canção com motivos fúnebres em tons estridentes - Homo sapiens.
Estou vacinado (já tinha dito), bebi do veneno que não me liquidou.
Já posso matar, já sou homem (adulto)! Já posso aniquilar os da minha espécie, sem remorsos!
Estar-lhes-ei a fazer um favor!
Libertar-vos-ei da dor;
Incorporei a morte!
Eu sou a morte!
Ah ah ah ah a a!
Não se assustem, pois sou eu o vosso filho, filho de Deus,
Satanás!
Estou a brincar, a brincar com o jogo dos Homens – vestidos de Paz e de Guerra – capacetes azuis e soldadinhos de chumbo! Todos bons cristãos – In Good we trust!
Há um fim que desconhecemos – Luz – aproximemo-nos dela, tudo será mais claro!
Que chatice, tenho vontade de não sei o quê…
Arroto, mas ainda não estou confortável com o meu corpo, pois a minha alma, pobre, perdeu as asas e não pode voar.
Irão de novo crescer, as asas do desejo, engrossar, ganhar forma e voar! Voar sobre o mar, sobre o mundo, sobre a tua cidade empestada de turistas, e na minha no Porto da minha partida, caminharei, com elas dobradas debaixo do sobretudo cinzento de marca que me deixas-te e dos seus bolsos uma a uma e com o passar do tempo cairão e perder-se-ão pedras preciosas - as nossas memórias - até que eu, velho, mais velho que esse macio manto que sempre será teu, morrerei como um espelho morre – estilhaçado, lançando pequenos reflexos de um mundo à nossa volta.
Ngaga, 13 de Novembro
Manto cinzento.docx |